Você já ouviu histórias de mulheres grávidas que desejam entregar o bebê para adoção logo após o parto?
Essa é uma realidade mais comum do que se imagina, especialmente entre mulheres que enfrentam vulnerabilidade social, financeira ou emocional.
Nesse post:
Mas surge uma dúvida delicada: a mãe biológica pode escolher quem vai adotar o bebê?
A resposta envolve aspectos legais, éticos e afetivos. E compreender o que a lei realmente permite é essencial para proteger tanto a gestante quanto a criança.
Neste artigo, vamos explicar como funciona a entrega legal para adoção, o papel da Justiça nesse processo e por que escolher diretamente uma família pode gerar sérios riscos jurídicos.
Vamos lá?
Entrega Legal para Adoção: o que é e como funciona
A entrega legal é o nome dado ao procedimento pelo qual a gestante ou mãe manifesta ao Judiciário o desejo de entregar o filho para adoção, de forma voluntária, sem cometer crime e com total sigilo.
Essa entrega deve ser feita na Vara da Infância e Juventude, com acompanhamento de uma equipe técnica (assistentes sociais e psicólogos) e de um juiz responsável.
Durante esse processo, a mãe é ouvida, orientada sobre suas alternativas e tem direito a um período de reflexão antes de confirmar a decisão.
Esse procedimento está previsto no artigo 19-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que garante à mulher gestante o direito de receber acolhimento, acompanhamento psicológico e assistência social, sem que isso seja considerado abandono.
Importante: entregar um bebê diretamente a uma família sem o conhecimento da Justiça configura a chamada “adoção à brasileira”, considerada ilegal e crime (art. 242 do Código Penal).
Para compreender melhor esse tipo de prática e seus riscos, você pode ler nosso artigo:
[Adoção à Brasileira é Crime? Entenda os Riscos e Consequências].
A gestante pode escolher quem vai adotar seu bebê?
Essa é uma das perguntas mais delicadas no campo da adoção.
A resposta é: em regra, não.
A gestante não pode escolher diretamente quem vai adotar o bebê.
De acordo com o ECA, todas as adoções devem passar pela Vara da Infância e Juventude e o cadastro nacional de adotantes do CNJ (Cadastro Nacional de Adoção).
Isso significa que a família adotiva deve estar previamente habilitada — ou seja, ter passado por um processo de avaliação psicológica, social e jurídica antes de poder receber uma criança.
O objetivo é garantir que a escolha da família seja feita com base no melhor interesse da criança, e não apenas em critérios pessoais da gestante ou por vínculos afetivos informais.
Por que a gestante não pode escolher livremente a família?
A restrição existe para proteger a criança de possíveis situações de tráfico, coerção, exploração ou vínculos afetivos frágeis.
Permitir que a mãe “escolha” livremente poderia abrir brechas para:
- Compra e venda de crianças disfarçadas de adoção.
- Pressão emocional sobre gestantes em situação de vulnerabilidade.
- Adoções ilegais sem o devido acompanhamento do Estado.
- Risco de arrependimento, sem apoio psicológico ou social.
O Estado, portanto, atua como mediador e fiscalizador, garantindo que o bebê seja acolhido por uma família preparada, avaliada e legalmente habilitada.
O que a grávida pode fazer legalmente?
Embora não possa escolher diretamente a família, a gestante tem o direito de participar ativamente do processo e manifestar suas preferências e preocupações.
Durante o acompanhamento na Vara da Infância, a equipe técnica acolhe informações sobre:
- As razões da entrega;
- A situação emocional da mãe;
- Possíveis preferências quanto ao perfil da família (como religião, estrutura familiar, região, etc.).
Essas informações são consideradas pelo juiz e pela equipe técnica ao escolher a família mais adequada, mas a decisão final não pertence à mãe biológica.
O papel da gestante é de colaborar com o processo legal, sem perder sua dignidade nem seus direitos como mulher.
E se a mãe quiser entregar o bebê a alguém conhecido?
Essa situação é bastante comum. Às vezes, a grávida deseja que o bebê seja criado por um parente, uma amiga ou um casal de confiança.
Mesmo nesses casos, a entrega direta não é permitida.
O que pode ocorrer é a avaliação judicial dessa família específica, caso haja interesse formal em adotar a criança.
O juiz, então, poderá autorizar a adoção direta somente se verificar que essa decisão atende ao melhor interesse da criança — nunca por simples vontade das partes.
Em outras palavras, a escolha pessoal pode até ser considerada, mas depende da aprovação da Justiça, após rigorosa análise.
Como funciona o passo a passo da entrega legal
Para entender melhor, veja como ocorre o processo de entrega voluntária para adoção no Brasil:
- Procura da Vara da Infância e Juventude:
A gestante deve comparecer ao fórum mais próximo e informar seu desejo de entregar o bebê para adoção. - Acolhimento e escuta especializada:
Uma equipe formada por assistentes sociais e psicólogos vai ouvir a mãe, compreender sua história e oferecer apoio. - Orientação sobre direitos:
A gestante é informada sobre todas as alternativas — inclusive programas de apoio à maternidade — antes de confirmar a entrega. - Acompanhamento até o parto:
O Judiciário garante que a mãe tenha assistência durante a gestação e o parto. - Confirmação após o nascimento:
Depois do parto, há um prazo para reflexão antes da decisão definitiva. - Escolha da família habilitada:
O bebê é encaminhado a uma família aprovada pelo cadastro do CNJ, conforme critérios de compatibilidade e interesse da criança. - Adoção e acompanhamento pós-entrega:
A equipe judicial monitora o caso para garantir que o bebê esteja em ambiente saudável e estável.
Entregar o bebê para adoção é crime?
Não, a entrega legal não é crime.
Pelo contrário, é um ato de amor e responsabilidade, reconhecido e protegido pela lei.
O que é crime é entregar o bebê fora do processo judicial, o que configura adoção à brasileira, passível de pena de reclusão de 1 a 5 anos, conforme o art. 242 do Código Penal.
A diferença está na intenção e na legalidade do ato:
- Entrega legal: Feita na Justiça, com acompanhamento e proteção.
- Entrega irregular: Feita por conta própria, sem controle judicial.
A mãe pode se arrepender depois?
Sim.
Durante o processo de entrega, a mãe tem direito ao arrependimento até a conclusão da adoção.
Ou seja, enquanto o bebê ainda estiver sob guarda provisória, a gestante pode desistir da entrega e optar por ficar com o filho.
O ECA assegura esse direito porque entende que a decisão de entregar um bebê para adoção é extremamente sensível e pode ser tomada em momentos de fragilidade emocional.
Por isso, a Justiça sempre oferece acompanhamento psicológico e período de reflexão antes de tornar a decisão definitiva.
Casos especiais: gestantes em situação de rua, violência ou dependência química
Em situações de extrema vulnerabilidade, como dependência química, violência doméstica ou ausência total de suporte familiar, o Ministério Público e o Conselho Tutelar podem acionar a Justiça para garantir a proteção da criança.
Mesmo assim, a mãe nunca perde automaticamente o direito de ser ouvida e acompanhada.
O foco é preservar o melhor interesse do bebê, mas sempre respeitando os direitos da mulher.
A legislação brasileira reconhece que a pobreza, por si só, não é motivo para destituir o poder familiar (art. 23 do ECA).
Por isso, a Justiça prioriza apoio social e políticas públicas antes de autorizar a adoção.
O papel do CNJ e do Cadastro Nacional de Adoção
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mantém o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), que reúne os dados de todas as crianças aptas à adoção e das famílias habilitadas no país.
Isso garante transparência, segurança e prioridade ao interesse da criança, evitando que adoções ocorram de forma clandestina.
A entrega legal é imediatamente registrada nesse sistema, e a família escolhida entre as habilitadas é aquela mais compatível com o perfil da criança e com as preferências registradas pela mãe, se houver.
Mais informações podem ser consultadas no site oficial do CNJ:
https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/adocao/
Adoção humanizada: uma visão de respeito e empatia
A entrega para adoção deve ser tratada sem preconceito e sem julgamento moral.
Muitas mulheres que tomam essa decisão o fazem por amor e senso de responsabilidade, reconhecendo seus limites naquele momento da vida.
Por isso, o termo “adoção humanizada” tem ganhado força, valorizando o acolhimento, o respeito à gestante e o direito à escolha consciente, dentro da lei.
Em vez de punir, o sistema busca amparar e orientar.
E isso é essencial para romper o ciclo de abandono e adoções ilegais.
Diferença entre adoção legal e adoção à brasileira
Aspecto | Adoção Legal | Adoção à Brasileira |
---|---|---|
Intermediação | Vara da Infância e Juventude | Acordo informal entre particulares |
Documentação | Processo judicial e cadastro no CNJ | Sem registro oficial |
Consequências | Segurança jurídica e acompanhamento | Crime, perda de guarda e nulidade |
Proteção à mãe | Acolhimento e apoio psicológico | Risco de coação e arrependimento |
Direitos da criança | Garantidos pelo Estado | Violados pela informalidade |
Como a mãe pode pedir ajuda para fazer tudo de forma correta
A gestante que deseja entregar o bebê deve procurar a Vara da Infância e Juventude da sua cidade.
Se não souber onde fica, pode procurar:
- O Conselho Tutelar mais próximo;
- O hospital público onde faz o pré-natal;
- O CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social);
- Ou ainda a Defensoria Pública, que oferece orientação gratuita.
Esses órgãos fazem o encaminhamento ao juiz responsável, sem qualquer tipo de punição à mãe.
Conclusão
A gestante não pode escolher diretamente quem vai adotar o bebê, mas pode entregar a criança de forma segura, legal e protegida pela Justiça.
A entrega voluntária é um ato legítimo e humano, que deve ser tratado com respeito, empatia e apoio psicológico.
Ao buscar o caminho legal, a mãe garante dignidade para si e um futuro seguro para o bebê, sem riscos jurídicos.
Se você se interessa pelo tema, leia também:
- Adoção no Brasil: Regras, Processo e Dúvidas Comuns
- Busca Ativa do CNJ: como funciona o “match” que já viabilizou mais de mil adoções em 2025
Checklist: pontos principais do artigo
- A entrega voluntária é legal e protegida pelo ECA.
- A mãe não pode escolher diretamente a família adotiva.
- Todas as adoções passam pela Vara da Infância e Juventude.
- Adoção à brasileira é crime, punido com reclusão.
- A mãe pode se arrepender até a conclusão do processo.
- A Justiça escolhe a família habilitada com base no interesse da criança.
- O CNJ mantém o Cadastro Nacional de Adoção, que garante segurança e transparência.
Perguntas Frequentes:
A grávida precisa de advogado para entregar o bebê à adoção?
Não obrigatoriamente. O processo é gratuito e assistido pela Vara da Infância, com psicólogos e assistentes sociais. Mas o acompanhamento jurídico pode trazer mais segurança.
Posso entregar o bebê ainda durante a gestação?
Sim. O ECA permite que a mulher procure a Vara da Infância ainda grávida, para receber acompanhamento e orientação.
E se eu mudar de ideia depois do parto?
Você pode se arrepender até a sentença final da adoção, desde que manifeste seu desejo à Justiça.
A família adotiva pode ser parente meu?
Sim, desde que o juiz entenda que isso atende ao melhor interesse da criança e a família passe pela habilitação legal.
O nome da mãe fica em sigilo?
Sim. Todo o processo de entrega legal é sigiloso e protegido por lei, preservando a identidade da gestante.