Como Fica a Partilha de Dívidas no Divórcio ou na Separação?

partilha de dívidas no divórcio ou separação: alianças sobre documento jurídico
Alianças sobre documento, simbolizando a divisão de obrigações no fim do casamento

A partilha de dívidas no divórcio ou na separação é um dos pontos que mais gera dúvida e tensão. Quem paga o quê? Em quais situações a dívida é dividida entre o casal e quando fica apenas com quem contraiu? Neste artigo, vou te explicar de forma simples e prática como funciona a responsabilidade por dívidas na dissolução da vida conjugal, considerando os principais regimes de bens e exemplos do dia a dia.

Quando o relacionamento termina, não é só a partilha de bens que entra em pauta. A partilha de dívidas também precisa ser organizada. E não é exagero dizer que, muitas vezes, o passivo traz mais conflito do que o ativo. A regra geral depende do regime de bens, do momento em que a dívida foi contraída e, principalmente, se ela beneficiou a família. Você já se perguntou por que isso acontece? Porque o direito busca equilíbrio. Se a dívida ajudou a sustentar o núcleo familiar, é justo que a responsabilidade seja compartilhada. Se foi exclusivamente pessoal, a lógica muda.

O que é a partilha de dívidas e por que ela existe?

A partilha de dívidas é a divisão das obrigações financeiras assumidas pelo casal durante a união, no momento do divórcio ou da separação. A ideia é equilibrar o que cada um vai levar, considerando não apenas os bens, mas também o que ficou por pagar. No Brasil, o Código Civil prevê que as dívidas assumidas para os encargos da família podem recair sobre o patrimônio comum, especialmente nos regimes de comunhão. Em linguagem direta, dívidas do dia a dia da família tendem a ser compartilhadas.

Como a partilha de dívidas varia conforme o regime de bens

1. Comunhão parcial de bens

No regime de comunhão parcial, tudo o que foi adquirido onerosamente durante o casamento tende a integrar o patrimônio comum. O mesmo raciocínio se aplica às dívidas assumidas na constância da união e em benefício da família. Nesses casos, a dívida pode ser dividida. O artigo 1.663, §1º estabelece que as dívidas contraídas na administração do patrimônio obrigam os bens comuns e os particulares do cônjuge administrador, além dos do outro na proporção do proveito que teve. Já o artigo 1.664 afirma que os bens da comunhão respondem pelas obrigações assumidas para atender aos encargos da família.

Em termos práticos
São exemplos de dívidas que costumam ser partilháveis neste regime quando comprovado o benefício familiar:

  • Financiamento de imóvel para moradia do casal.
  • Empréstimo para reforma da casa ou compra de móveis.
  • Despesas médicas e educacionais de filhos.

Quando a dívida tende a não se comunicar

  • Empréstimo para hobby individual caro sem vínculo com a família.
  • Dívida assumida para investimentos pessoais e arriscados sem participação do outro.
  • Despesas secretas que não tenham conexão com a vida comum.

2. Comunhão universal de bens

Em comunhão universal, a regra é de ampla comunicação de bens e, em geral, de obrigações assumidas na constância do casamento. Ainda assim, a análise do proveito para a família continua importante para definir a extensão da responsabilidade. Dívidas claramente pessoais podem ser excluídas da esfera comum.

3. Separação convencional total de bens

Na separação total, cada um administra seu patrimônio e responde por suas próprias dívidas. O artigo 1.687 do Código Civil deixa claro que os bens permanecem sob administração exclusiva de cada cônjuge. Em consequência, a dívida contraída por um não atinge o outro, salvo em situações específicas de coobrigação, fraude ou prova de benefício direto ao outro.

4. Participação final nos aquestos

Durante a união, funciona como separação de bens. Na dissolução, apura-se o que foi adquirido de forma onerosa e se faz a compensação. Em termos de dívidas, avalia-se o vínculo com os aquestos e o benefício à família para definir a responsabilidade.

5. União estável

Na falta de contrato escrito definindo outro regime, aplicam-se as regras da comunhão parcial, inclusive quanto a bens e partilha de dívidas. Isso vale para obrigações contraídas durante a convivência e em favor do núcleo familiar.

O papel do benefício à família e o ônus da prova

Na prática, o ponto central é responder: a dívida beneficiou a família? No entendimento do Superior Tribunal de Justiça, existe presunção de que a dívida assumida por um dos cônjuges durante a união favoreceu a família. Quem quer afastar a partilha dessa dívida precisa provar que o débito foi exclusivamente pessoal. Em outras palavras, o ônus da prova costuma recair sobre quem pretende excluir-se da responsabilidade.

Dica prática
Reúna extratos, contratos, notas fiscais e qualquer documento que mostre o destino da dívida. Comprovantes de matrícula escolar, notas de material de construção para reforma da casa ou comprovantes de despesas médicas ajudam a demonstrar o vínculo familiar da obrigação.

Dívidas antes e durante a união: o que muda

  • Dívidas anteriores ao casamento ou à união estável: tendem a ser pessoais e não se comunicam, salvo prova de que foram re-financiadas ou repactuadas para custear a vida familiar.
  • Dívidas contraídas durante a união: podem ser partilháveis quando relacionadas aos encargos da família ou à administração do patrimônio comum.

Casos comuns no dia a dia e como ficam na partilha de dívidas

1. Cartão de crédito

Cartão de crédito usado para despesas de supermercado, remédios, material escolar e contas da casa costuma ter caráter familiar, o que favorece a partilha de dívidas. Se o gasto foi com itens estritamente pessoais e de luxo, a tendência é não partilhar, sobretudo se houver comprovação do caráter individual.

2. Empréstimo pessoal

Se o empréstimo financiou reforma da casa, compra de eletrodomésticos ou quitação de dívidas familiares, pode ser dividido. Se foi para investimentos pessoais de alto risco, viagens individuais ou consumo sem vínculo com a família, pode não se comunicar.

3. Financiamento de imóvel

O financiamento do imóvel de moradia é exemplo clássico de dívida partilhável. A divisão segue a lógica do patrimônio líquido. Suponha:

  • Valor do imóvel: 300.000
  • Saldo devedor no divórcio: 200.000
  • Patrimônio líquido: 100.000

Cada um, em regra, fica com 50.000 de meação do patrimônio líquido. E a dívida remanescente de 200.000 deve ser ajustada conforme quem permanecerá no imóvel, possibilidade de venda, portabilidade ou transferência do financiamento. Em muitos casos, um compra a parte do outro e assume a totalidade do saldo junto ao banco, com acerto financeiro compensatório.

4. Financiamento de veículo

Se o carro é utilizado pela família, há forte argumento para comunicação da dívida. Se o veículo é ferramenta de trabalho individual e não integra a rotina do lar, é possível afastar a partilha, especialmente na separação total.

5. Empresas e dívidas societárias

Cotas de empresa são bens partilháveis conforme o regime de bens. Dívidas da empresa, porém, seguem as regras societárias e não se comunicam automaticamente ao cônjuge, salvo hipóteses específicas de responsabilidade do sócio administrador e desconsideração da personalidade jurídica. A análise é técnica e depende dos documentos da sociedade. Em caso de comunhão parcial ou universal, avalia-se o valor das cotas e não o passivo integral da atividade, salvo se comprovado benefício direto à família.

6. Fiança e aval

A fiança prestada sem outorga conjugal tem validade, mas a eficácia fica limitada ao patrimônio do fiador. Esse detalhe pode proteger a meação do outro cônjuge.

7. Multas e indenizações por ato pessoal

Multa de trânsito tomada por um só cônjuge ao dirigir sozinho, ou indenização por ato ilícito exclusivamente pessoal, tende a não se comunicar ao outro. Se houver reflexo direto para a família, a análise muda.

Dívidas na separação de fato e na separação judicial

  • Separação de fato: a partir do rompimento efetivo da convivência, a relação entre despesas familiares e proveito do casal se enfraquece. Dívidas assumidas depois dessa ruptura têm maior chance de não serem partilháveis, a não ser que ainda haja benefício comum identificável.
  • Separação judicial: a separação judicial encerra os deveres conjugais e o regime de bens, com efeitos semelhantes aos do divórcio no que diz respeito à comunicação de dívidas.

Como comprovar que a dívida é familiar ou pessoal

Provas úteis para caracterizar dívida familiar

  • Faturas e notas de supermercado, escola, plano de saúde, condomínio e contas da casa.
  • Contratos de financiamento de imóvel de moradia, reformas e móveis.
  • Comprovantes de pagamentos referentes a despesas dos filhos.

Provas úteis para demonstrar caráter pessoal

  • Extratos e faturas com gastos de uso individual sem vínculo com o lar.
  • Contratos de investimento exclusivamente pessoal.
  • Documentos que mostrem a separação de contas e despesas após a separação de fato.

Como negociar a partilha de dívidas sem piorar o conflito

  1. Mapeie todas as dívidas com valores, credores, garantias, datas e finalidade.
  2. Classifique em familiares ou pessoais, com base em documentos.
  3. Avalie o fluxo de pagamento e a capacidade de cada parte.
  4. Considere a venda de bens para quitar dívidas caras e reduzir juros.
  5. Inclua cláusulas de responsabilidade claras nos acordos, com prazos e penalidades por inadimplemento.
  6. Formalize em escritura pública nos divórcios consensuais quanto for cabível.

Como ficam as dívidas na união estável

Na união estável, sem contrato definindo outro regime, valem as regras da comunhão parcial. A jurisprudência costuma aplicar os mesmos parâmetros de partilha de dívidas utilizados no casamento, inclusive a presunção de proveito familiar e a distribuição conforme a participação e o benefício.

Erros comuns ao lidar com a partilha de dívidas

  • Ignorar o passivo na hora de dividir bens.
  • Assumir dívidas do outro sem contrapartida, acreditando que o banco não aceitará a transferência.
  • Não registrar no acordo de divórcio como cada dívida será paga e em qual proporção.
  • Deixar de notificar credores quando houver alteração do responsável pelo pagamento.
  • Falta de prova sobre a finalidade da dívida.

Perguntas que você pode estar se fazendo agora

Se o cartão está só no meu nome, a dívida é só minha?
Não necessariamente. Se as compras foram para a casa ou para filhos, há indício de dívida familiar. Documentos e faturas detalhadas ajudam a comprovar.

Assinei um empréstimo para meu cônjuge. O que acontece?
Se você é coobrigado no contrato, pode responder solidariamente. A discussão sobre proveito da família ainda existe, mas a sua assinatura traz responsabilidade contratual.

Quem fica no imóvel continua com a dívida do financiamento?
Na prática, muitas vezes quem permanece assume o saldo devedor e indeniza o outro pela meação do patrimônio líquido. O banco precisa aceitar a transferência do contrato ou uma novação com novo titular.

5 passos para organizar a partilha de dívidas com segurança

  1. Levante tudo: liste cada dívida com contrato, saldo, juros e vencimento.
  2. Vincule a finalidade: prove se é familiar ou pessoal.
  3. Defina quem paga: ajuste percentuais e cronograma.
  4. Ajuste com o credor: informe e, se possível, renegocie.
  5. Formalize: inclua no acordo de divórcio ou na sentença.
  • Encargos da família e administração do patrimônio comum: artigos 1.663, §1º e 1.664 do Código Civil.
  • Presunção de benefício comum e ônus da prova do meeiro: orientação do STJ.
  • União estável seguindo regras da comunhão parcial, salvo contrato: aplicação também à partilha de dívidas.
  • Fiança sem outorga conjugal com eficácia restrita ao patrimônio do fiador: Súmula 332 do STJ.
  • Divórcio consensual em cartório com partilha em escritura pública quando cabível.

Exemplos rápidos para visualizar

Exemplo 1

  • Empréstimo de 40.000 para reforma da casa.
  • Comprovantes mostram compra de material e pagamento de obra.
  • Tende a ser partilhável nos regimes de comunhão.

Exemplo 2

  • Cartão com gastos em viagens individuais de luxo e equipamentos esportivos de alto valor.
  • Sem conexão com a família.
  • Pode ser excluído da partilha, desde que provado o caráter pessoal.

Exemplo 3

  • Financiamento de carro usado para levar os filhos à escola e para o trabalho de ambos.
  • Forte indício de dívida familiar, com partilha conforme o regime.

Como apresentar a partilha de dívidas no acordo ou na sentença

Para evitar discussões futuras, descreva no acordo:

  • Lista de cada dívida com número do contrato, banco e saldo atualizado.
  • Percentual de responsabilidade de cada parte e como será paga.
  • Quem ficará com o bem vinculado à dívida, se houver garantia real.
  • Prazos e penalidades em caso de atraso.
  • Cláusula de comunicação ao credor e, se possível, anexar o termo de anuência ou de renegociação.

Perguntas Frequentes:

Dívidas no meu nome sempre são só minhas?

Não. Se a dívida foi usada para encargos da família, a tendência é a partilha de dívidas conforme o regime de bens e a prova do benefício comum.

Como provar que a dívida é pessoal do outro?

Mostrando que não houve proveito para a família. É do interessado em afastar a partilha o ônus da prova, segundo o entendimento do STJ.

Dívida da empresa entra na partilha do casal?

Não automaticamente. Em regra, partilham-se cotas e valores, e não o passivo integral da atividade. A responsabilidade societária segue normas próprias.

Fiança que o meu cônjuge deu sem minha anuência atinge minha meação?

A fiança é válida, mas a eficácia fica restrita ao patrimônio de quem a prestou, segundo a Súmula 332 do STJ.

Na união estável é igual ao casamento?

Sem contrato definindo outro regime, valem as regras da comunhão parcial, inclusive quanto à partilha de dívidas.

Checklist final para não errar

  • Identifique o regime de bens do casal.
  • Liste todas as dívidas com documentos e finalidade.
  • Separe o que é familiar do que é pessoal.
  • Negocie com o credor quando houver mudança de responsável.
  • Formalize no acordo de divórcio ou na sentença.
  • Guarde provas de pagamentos, repactuações e quitações.

Conclusão

A partilha de dívidas no divórcio ou na separação exige olhar técnico e sensível. Mais do que saber “quem paga”, é preciso entender por que aquela obrigação existe e se ela serviu ou não à família. Regras do regime de bens, prova documental e diálogo com credores fazem toda a diferença. Em casos com financiamento de imóvel, veículos, cartões e fianças, o caminho passa por calcular o patrimônio líquido, ajustar responsabilidades e formalizar com clareza. Assim, cada um segue a vida com previsibilidade e segurança jurídica.

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