A perda de alguém querido já é, por si só, um momento muito delicado. Mas quando o falecimento envolve questões patrimoniais e familiares mal resolvidas, a dor pode ser ainda maior. E um dos pontos que mais gera dúvidas e conflitos é: quem vive em união estável tem direito à herança?
Muita gente acredita que apenas o cônjuge casado oficialmente pode herdar os bens da pessoa falecida. Mas isso não é verdade. A união estável também pode gerar direitos sucessórios — desde que algumas condições sejam respeitadas.
Neste artigo, vamos explicar de forma simples e direta 5 situações em que a união estável dá direito à herança, além de esclarecer como esse direito funciona na prática e o que fazer para garantir sua proteção legal.
Nesse post…
O que é união estável?
Antes de tudo, é importante entender o que significa estar em união estável. A lei brasileira considera união estável a convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, com o objetivo de constituir família.
Ou seja, não é preciso casar no cartório para que um relacionamento seja reconhecido como união estável. Basta que ele preencha esses requisitos e seja comprovado — por exemplo, por meio de contas conjuntas, testemunhas, dependência em plano de saúde, filhos em comum, entre outros.
A palavra-chave “união estável” aparece aqui para deixar claro que esse tipo de relação pode sim ter efeitos legais importantes, inclusive na hora da partilha de bens.
Como funciona o direito à herança na união estável?
Segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), desde 2017, o companheiro ou companheira tem os mesmos direitos sucessórios do cônjuge casado, ou seja, pode herdar os bens do(a) parceiro(a) falecido(a).
Esse entendimento tem base na igualdade jurídica entre casamento e união estável garantida pela Constituição. Mas, na prática, nem sempre é tão simples.
A seguir, vamos mostrar cinco situações comuns em que quem vive em união estável pode ter direito à herança — e o que considerar em cada uma delas.
1. Quando não há testamento
Herança na união estável sem testamento
Se a pessoa falecida não deixou testamento, a herança será dividida de acordo com as regras do Código Civil. Nesse caso, o companheiro sobrevivente pode ter direito à herança, conforme a ordem de vocação hereditária:
- Primeiro, herdam os descendentes (filhos, netos);
- Depois, os ascendentes (pais, avós);
- E, em terceiro lugar, o companheiro ou companheira.
Porém, se o(a) falecido(a) não tiver filhos nem pais vivos, o companheiro herda tudo.
Se houver filhos em comum ou apenas do falecido, o companheiro terá direito a uma parte da herança, dependendo do regime de bens adotado e do tipo de bem (comunicável ou particular).
Exemplo prático: João e Ana viviam juntos há 12 anos, nunca se casaram, mas tinham uma vida de casal. João faleceu sem deixar testamento e sem pais vivos. Ana tem direito à herança junto com os filhos de João.
2. Quando existe regime de comunhão parcial de bens
Regime de bens influencia na herança
A maioria dos casais em união estável, por padrão, adota o regime de comunhão parcial de bens. Nesse regime, tudo o que foi adquirido durante a convivência é considerado bem comum.
Nesse caso, se um dos dois falece:
- O companheiro sobrevivente tem direito à meação (metade dos bens comuns);
- E também pode ter direito à herança dos bens particulares do falecido.
Importante: meação não é herança. É a parte que já pertence ao companheiro. A herança é o que vem depois da divisão dos bens comuns.
Exemplo prático: Carla e Marcos viviam em união estável há 15 anos e compraram juntos um apartamento. Quando Marcos faleceu, Carla ficou com 50% (meação) e ainda teve direito à herança sobre os bens particulares de Marcos.
3. Quando há filhos apenas de um dos companheiros
A herança é dividida com os filhos do falecido
Em situações em que apenas o falecido tinha filhos, o companheiro sobrevivente participa da herança como herdeiro, junto com esses filhos.
Nesse caso, a herança será dividida em partes iguais entre:
- Os filhos do falecido;
- E o companheiro sobrevivente.
Exemplo prático: Pedro tinha dois filhos de um relacionamento anterior e vivia em união estável com Júlia há 10 anos. Ao falecer, Pedro não deixou testamento. Júlia tem direito à herança junto com os dois filhos.
Dica: Se houvesse filhos comuns do casal, a divisão ainda existiria, mas o juiz pode aplicar ajustes conforme o caso.
4. Quando há prova da união estável
Comprovar a união é essencial para ter direito à herança
Não basta apenas dizer que vivia junto. Para ter direito à herança, o companheiro sobrevivente precisa comprovar a união estável.
Os meios de prova mais usados são:
- Certidão de união estável feita em cartório;
- Declaração de dependente no plano de saúde ou no Imposto de Renda;
- Contas conjuntas, fotos, testemunhas, entre outros.
Exemplo prático: Laura e Rafael moravam juntos há 6 anos, mas nunca formalizaram a união. Quando Rafael faleceu, os irmãos dele tentaram impedir Laura de participar da herança. Com fotos, mensagens, contas conjuntas e testemunhas, Laura conseguiu comprovar a união e garantiu seu direito.
📌 Leia também:
5. Quando há bens adquiridos durante a convivência
União estável e direito sobre bens adquiridos juntos
Mesmo que a união estável não tenha sido formalizada no cartório, os bens adquiridos durante a convivência são, em regra, considerados do casal, no regime de comunhão parcial.
Se um dos dois falece, o outro tem direito à meação e à herança sobre os bens particulares.
Exemplo prático: Luana e Cláudio compraram juntos uma casa durante a união estável. Quando Cláudio faleceu, Luana garantiu o direito à metade do imóvel (meação) e ainda participou da herança dos demais bens dele.
E quando há testamento?
Mesmo quando há testamento, o companheiro pode ter direito a uma parte dos bens, especialmente se for considerado herdeiro necessário.
A lei protege metade dos bens para herdeiros necessários (filhos, pais e companheiro). O restante pode ser deixado livremente em testamento.
Se o testamento for feito sem considerar o companheiro como herdeiro necessário, ele pode contestar judicialmente, com base no direito garantido pelo STF.
União estável homoafetiva: os mesmos direitos
Desde 2011, o Supremo Tribunal Federal reconhece que casais homoafetivos têm os mesmos direitos de união estável e sucessão que os casais heterossexuais.
Ou seja, companheiros do mesmo sexo também podem ser herdeiros e têm direito à meação, à herança e à partilha igualitária dos bens.
Precisa registrar a união estável no cartório?
Não é obrigatório, mas registrar ajuda muito. A certidão pública de união estável evita discussões futuras e facilita o reconhecimento do relacionamento em processos judiciais, como inventário e pensão.
Conclusão
A união estável pode sim gerar direito à herança em diversas situações. Mas é fundamental que o relacionamento seja comprovado e que as regras legais sejam respeitadas.
O ideal é que o casal pense com antecedência e, se possível, formalize a união estável em cartório. Também é recomendável deixar tudo documentado, inclusive decisões sobre bens, regime de convivência e vontades em caso de falecimento.
Quando bem orientadas, essas decisões evitam conflitos, protegem quem fica e garantem que a vontade da pessoa falecida seja respeitada.
✅ Resumo rápido: principais pontos do artigo
- A união estável garante direitos sucessórios mesmo sem casamento no papel;
- O companheiro pode ter direito à herança na ausência de testamento;
- É essencial comprovar a união estável com documentos e testemunhas;
- Filhos do falecido dividem a herança com o companheiro sobrevivente;
- Casais homoafetivos também têm direito à herança;
- Registrar a união em cartório facilita o reconhecimento de direitos;
- O regime de bens adotado influencia na divisão patrimonial.