Regime de Bens: É Possível Mudar Após o Casamento?

Mudança de regime de bens no casamento representada por martelo de juiz e alianças sobre a mesa
Imagem ilustrativa mostrando a representação jurídica da mudança de regime de bens no casamento.

O regime de bens define como o patrimônio de um casal será administrado e partilhado durante e após o casamento. Mas o que muitos casais não sabem é que é possível mudar o regime de bens depois do casamento, desde que sejam cumpridos alguns requisitos legais e o pedido seja autorizado pelo juiz.

Neste artigo, você vai entender o que diz a lei, quais são as exigências, os riscos e o passo a passo para fazer essa alteração de forma correta e segura.

O que é o regime de bens

O regime de bens é o conjunto de regras que determina como os bens e dívidas dos cônjuges serão administrados. Ele define, por exemplo, se o que é adquirido durante o casamento será comum aos dois ou permanecerá individual.

Os principais regimes previstos no Código Civil são:

  • Comunhão parcial de bens
  • Comunhão universal de bens
  • Separação total de bens
  • Participação final nos aquestos

Você pode saber mais sobre cada um deles nos artigos Comunhão Parcial x Comunhão Universal: Entenda as Diferenças e Separação Total de Bens: Como Funciona e Quando Vale a Pena?.

O que diz a lei sobre a mudança do regime de bens

A alteração do regime de bens é permitida pelo artigo 1.639, § 2º do Código Civil, que dispõe:

“É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.”

O artigo 734 do Código de Processo Civil complementa essa regra, determinando que a petição deve ser assinada pelos dois cônjuges, com a exposição dos motivos e documentos que comprovem a boa-fé e a inexistência de prejuízo a terceiros.

Portanto, a mudança não pode ser feita diretamente em cartório, sendo necessário um processo judicial de jurisdição voluntária, conduzido por advogado.

Entendimento do STJ sobre a retroatividade (ex tunc)

Por muito tempo, prevaleceu o entendimento de que a alteração só produzia efeitos a partir da decisão judicial (ex nunc). No entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou a admitir, em casos específicos, que a mudança possa ter efeitos retroativos (ex tunc) — ou seja, desde a data do casamento — desde que não haja prejuízo a terceiros.

Esse entendimento foi reafirmado no AgInt no REsp 1.671.422/SP (2023), da 4ª Turma do STJ, que reconheceu a possibilidade de retroatividade quando a medida é motivada e legítima.

Por outro lado, em situações de risco patrimonial ou possíveis fraudes, os tribunais costumam manter a regra geral, aplicando efeitos apenas ex nunc. Tudo dependerá da análise judicial do caso concreto.

Requisitos para alterar o regime de bens

A mudança do regime de bens só será admitida se preenchidos os seguintes requisitos:

  1. Pedido motivado e conjunto
    O pedido deve ser feito pelos dois cônjuges, apresentando razões legítimas para a mudança, como planejamento patrimonial, proteção de empresa familiar ou reorganização de bens.
  2. Ausência de prejuízo a terceiros
    O juiz verificará se não há credores ou terceiros que possam ser afetados pela modificação. Em alguns casos, pode ser exigida a publicação de edital.
  3. Transparência e boa-fé
    É preciso comprovar que a alteração tem finalidade lícita e não busca fraudar credores, pensões ou obrigações anteriores.
  4. Averbação no registro civil
    Após a sentença, o novo regime deve ser averbado na certidão de casamento.

Importante: o STJ entende que não é obrigatório apresentar a relação detalhada de todos os bens do casal para que o pedido seja aceito, desde que o juiz disponha de informações suficientes para avaliar a boa-fé (STJ, REsp 1.318.281/MG, 2021).

Documentos geralmente exigidos

A documentação pode variar conforme o tribunal, mas em geral são solicitados:

  • Documentos pessoais dos cônjuges (RG, CPF e certidão de casamento atualizada)
  • Certidões negativas cíveis, fiscais e criminais
  • Documentos que comprovem o motivo do pedido (declarações, contratos, registros empresariais)
  • Relação resumida dos bens atuais, se necessário
  • Comprovante de residência
  • Procuração do advogado responsável

Passo a passo para mudar o regime de bens

  1. Consultar um advogado especializado em Direito de Família
    Ele avaliará se o pedido é viável e quais documentos são necessários.
  2. Elaborar a petição motivada
    O advogado redigirá o pedido conjunto com as justificativas e anexará a documentação.
  3. Protocolar a ação judicial
    O pedido é encaminhado ao juiz da Vara de Família do domicílio do casal.
  4. Análise do Ministério Público e despacho judicial
    O MP avalia se há indícios de fraude ou prejuízo a terceiros.
  5. Audiência e sentença
    O juiz decide se autoriza a mudança, podendo ou não conceder efeitos retroativos.
  6. Averbação da sentença
    Com a decisão favorável, a alteração é registrada no Cartório de Registro Civil.

Custos e prazos do processo

Os custos envolvem:

  • Custas judiciais (variam conforme o estado e podem ser isentas com pedido de gratuidade)
  • Taxa de averbação no cartório de registro civil
  • Honorários advocatícios, conforme complexidade do caso

O prazo médio para conclusão pode variar entre 3 meses e 1 ano, dependendo da comarca e da necessidade de edital ou manifestação do Ministério Público.

Riscos e cuidados importantes

  • A alteração não pode ser usada para fraudar credores ou ocultar bens.
  • O juiz pode indeferir o pedido se entender que há má-fé.
  • A retroatividade depende de decisão expressa — não é automática.
  • Mesmo com a mudança, bens já partilhados ou alienados não são afetados.
  • O novo regime só tem validade após o trânsito em julgado e a averbação da sentença.

Exemplo prático

Um casal casado sob comunhão parcial de bens decide mudar para separação total, pois um dos cônjuges passou a ter empresa própria e deseja proteger o patrimônio familiar. Eles ingressam juntos com o pedido judicial, comprovam a boa-fé e a inexistência de dívidas. O juiz autoriza a mudança, com efeitos a partir da decisão (ex nunc), garantindo segurança jurídica sem prejudicar terceiros.

Perguntas frequentes

Posso mudar o regime de bens sem a autorização do meu cônjuge?

Não. O pedido deve ser feito em conjunto, com a anuência de ambos.

A mudança pode ser feita em cartório?

Não no casamento. Apenas a união estável permite alteração extrajudicial, conforme o Provimento 37/2014 do CNJ.

A alteração tem efeito retroativo automaticamente?

Não. A retroatividade só ocorre se o juiz expressamente autorizar e se não houver prejuízo a terceiros.

Preciso apresentar a lista completa de bens do casal?

Não é obrigatório, mas é importante demonstrar boa-fé e ausência de fraudes.

A mudança do regime influencia heranças?

Sim. O novo regime pode afetar o direito sucessório de cada cônjuge, devendo ser analisado com orientação jurídica.

Conclusão

A alteração do regime de bens após o casamento é uma possibilidade prevista em lei, mas que exige cautela, boa-fé e autorização judicial. A decisão depende da análise do juiz e da comprovação de que não haverá prejuízo a terceiros.

Antes de tomar qualquer decisão, é fundamental contar com a orientação de um advogado especializado, que poderá avaliar se a mudança é realmente vantajosa no seu caso e conduzir o processo de forma segura.

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